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16/9/2012
É domingo, fim da manhã, muito Sol, voltou o meu otimismo. Reencontro o Uzbequistão. Reencontro a Ásia Central.
Em meio ao labirinto da cidade velha de Kokand, entre seus muros que escondem casas com grandes pátios e árvores carregadas de frutas, surge uma mesquita e uma casa de chá, uma em frente à outra. Ambas não têm importância histórica nenhuma. Ambas não têm importância arquitetônica nenhuma. São simples, estão sujas.
Um grupo de senhores idosos e de meia-idade senta, um ao lado do outro, em um banco do lado de fora da casa de chá. São seis. Todos uniformizados com o chapéu uzbeque, o dope, preto com detalhes brancos. Ao lado, o dono da casa de chá prepara uns espetinhos de carne numa grelha com carvão. Saúdo a todos, Assalamaleykum. Respondem com cordialidade e curiosidade. Dentro da casa de chá, mesas para se sentar, típicas daqui. Gastas pelo tempo. Cobertas com tapetes puídos. Nenhum conforto. As paredes, pintadas de vermelho-laranja. Um poste indica a direção da cidade de Meca. Luz, só a que entra pelas janelas.
Me sento em uma das mesas. E peço um chá.
E o chá vem; e os senhores também vêm, para perto de mim, com as orelhas em pé. Devo ser o primeiro turista a querer compartilhar alguns minutos com eles. A curiosidade os devora. De onde você é? O que faz aqui? O que faz da vida? Gosta daqui? E as eternas... você é casado? Por que não? (difícil de responder essa, em qualquer língua). Qual é o seu salário? (segue-se a conversão instantânea de cabeça entre reais e sums, que também não é nada fácil). E chá vai, chá vem, meu pouco russo aos trancos e barrancos cria um círculo de sorrisos.
Logo a casa de chá vira a mais rica de histórias do Uzbequistão. Falo onde estive, o que vi. Sinto que sou alvo de uma inveja boa da parte de todos os senhores. Que maravilha seria conhecer o Brasil, dizem.
O chá preto é o mais delicioso, fluindo com conforto da tigela para minha boca, lubrificando o bate-papo sem pressa. Posso ficar o dia inteiro aqui. Não tenho que correr. Esqueço os temores e desafios da minha viagem. E eles se tornam instantaneamente meus velhos companheiros. Eu os ajudo a sonhar. Eles viajam para muito longe, para onde, infelizmente, quase que com certeza nunca poderão viajar. Pela falta de dinheiro. Pela falta de saúde.
Eis a função do viajante, fazer os seus anfitriões viajarem. Assim o viajante paga pelo prazer de conhecer um outro mundo.
Eis a função do anfitrião, fazer o viajante se sentir em casa em outro mundo.
Quando uma hora e pouco se passam, me levanto, vou pagar. O preço é uma piada, baixíssimo, o preço que os locais pagam, não o que os turistas pagam. Apertos de mão, a mão esquerda tocando o peito na altura do coração, e mais sorrisos.
Ao sair da casa de chá, uma legião de outros senhores aparece de repente. Com seus chapéus preto-e-brancos. Estão todos saindo da mesquita. Pegam suas bicicletas estacionadas ao Sol. Ágeis, alguns com barbas brancas, se despedem uns dos outros e saem se equilibrando nas duas rotas, buscando a sombra.
Para onde vou agora? Não sei. Vejo uma esquina, vou por ali. Conhecer mais sorrisos.
Isso é a Ásia Central que mora em meu coração.
Isfara, 17/9, 19h
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